sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Os 3 chapas - Ibitirati





Início da via 3 chapas
Estávamos seguindo com a caminhonete em direção à ponte quebrada. Antes de iniciar a caminhada já começava o esforço, era preciso arrastar as várias árvores caídas que bloqueavam o caminho.
Em um determinado ponto uma árvore muito grande impediu a passagem. Descemos da caminhonete e arrumamos as nossas coisas. Ricardo, que voltaria com o carro, nos desejou boa sorte, corrigiu que talvez não era bom necessitar de sorte. Respondi que a sorte começa quando a sabedoria termina, rimos com o ditado improvisado.
Éramos quatro: eu , Elcio, Otaviano e o Cruel. Atravessamos a ponte e iniciamos a caminhada, era 1 hora da manhã do dia 28 de agosto. Após 3 horas estávamos na base da via Mar de Caratuvas. Não era a primeira vez que tentaríamos escalar a via 3 Chapas. Na semana anterior já havíamos chegado próximo da base da via. Mas alguns imprevistos e o erro de cálculo com o tempo obrigariam o retorno.
            Subimos uns 80 metros pela linha da via Mar de Caratuvas e começamos uma diagonal para a esquerda, tentando encontrar as marcas de nossa passagem anterior. Desde esse ponto fora 1 hora e meia de escalaminhada até chegar ao final da crista que torna possível visualizar a linha da via. O final da aproximação foi a sessão mais cansativa, pois tivemos que “nadar” por  mais1 hora e meia entre taquaras.
            Dividimos o grupo em duas duplas- eu e o Elcio, Otaviano e o Cruel – e iniciamos a escalada.
            O Elcio começou na ponta da corda. A linha começava por uma língua de vegetação e, quando começava a rocha, 2 chapas marcavam uma seção mais exigente – regletes e veios de cristal delicados. Após costurar a primeira chapa quebrou uma agarra e o Elcio teve uma queda. Depois passou o lance e seguiu por uma transversal que marcava o início do sistema de fendas.
            A próxima enfiada era uma chaminé que envolvia técnicas diversas - entalamento, oposição, chaminé – e a todo o momento incomodava o peso da mochila sendo arrastada. Dentro da chaminé existia um sistema de fendas para proteção móvel.
            A próxima enfiada era a mais difícil e bonita da via. Elcio começou a enfiada utilizando os dois sistemas de fenda que seguem em paralelo. Utilizava a técnica de tesoura apoiando-se nas duas faces de rocha. Em um ponto é necessário entrar completamente na fenda de off-width da direita, utilizando também a técnica de oposição com os pés apoiados em tufos de capim.
            Era hora de eu iniciar a guiada. A próxima enfiada passava por uma canaleta com vegetação, na parte mais vertical havia um tramo difícil de entalamento de mãos. Enquanto escalava uma informação não saía da minha cabeça: era necessário prestar atenção pois, em determinado momento, era preciso sair da sequência de fendas e seguir pela vegetação. Comecei então a seguir para a direita e, como a corda havia terminado, precisamos escalar em simultâneo para chegar a chapeleta, a última proteção fixa da via.
            Armamos a reunião na chapeleta e segui entre ilhas de vegetação e aderências para retornar ao sistema de fendas. Faltava um tramo de vegetação frágil para instalar uma proteção móvel. Comecei a me equilibrar  com cuidado e, enquanto tentava subir, o capim ia se despedaçando em minhas mãos. Pensei que iria cair e nesse momento fui puxado pela gravidade. Nesse instante tentei imaginar se a chapeleta aguentaria a queda 15 metros em fator 2. Instintivamente consegui deter a queda agarrando-me à vegetação de um pequeno platô. Esse era o momento prenunciado no início da jornada. A sorte estava iniciando e a sabedoria terminando.
            Olhei para o Elcio, ele parecia um pouco preocupado. Respirei e recomecei a escalar. Subi novamente sobre o frágil capim e dessa vez consegui passar o lance.
            Segui por uma canaleta de mato e, quando percebi a proximidade do fim da parede, segui pela esquerda subindo por uns blocos. Era o fim das dificuldades de escalada, o relógio marcava 11:30 hs, havíamos feito a segunda repetição da via.
            Tentamos nos hidratar e comer algo. Como estava muito quente e não havia sombra resolvemos continuar pelo cansativo vara-mato de caratuvas até chegar ao cume do Ibitirati.
            Chegamos ao cume do Ibitirati e aproveitamos a paisagem. Olhando um pouco encontramos a última chapa da via Eco Xiitas que alguns anos antes havíamos escalado.
            No cume do Pico do Paraná, enquanto esperávamos nossos amigos, descansamos e aproveitamos a paisagem. Às 17:00 hs o Otaviano e o Cruel chegaram – terceira repetição da via. Foi uma ocasião especial pois também chegavam o Fábio, o Ermínio,o Gean o e Glaucio, que haviam escalado a via Mar de Caratuvas. Será que em outra ocasião tantas pessoas haviam escalado no mesmo dia o Ibitirati? Não sei a resposta, mas 8 pessoas era um número fora do comum.
            Começamos a descida e nesse final de jornada – com o cansaço acumulado – surgia internamente o dúvida: por que escalamos?
            Depois de anos escalando não sei a resposta, mas Lionel Terray, há décadas, definiu corretamente essa atividade como a Conquista do Inútil - ele tinha razão.
            Próximo à fazenda do Pico Paraná estava o nosso amigo Valdesir nos esperando. Para nossa alegria ele trazia cerveja e cachorro quente. Depois de tanto esforço esse era o nosso paraíso. E como era simples!


Gostaria de agradecer os nossos amigos Ricardo  e Valdesir que gentilmente providenciaram o nosso transporte, obrigado.
Elcio na reunião no final da primeira chaminé

Alessandro na penúltima enfiada



Encontramos a última chapa da via Eco Xiitas

Ibitirati ao final do dia

Paisagem privilegiada

Aproveitando o pôr do sol no cume do Pico Paraná